quarta-feira, maio 19, 2004

Um Jardim Na Cidade

Relva verde e fresca.
Acácias de um estranho verde-dourado.
Pequenas sebes rasteiras, ladeando os canteiros,
como que de mãos dadas com os ladrilhos.
É um jardim na cidade.
E no jardim, um velho banco de madeira.
E no velho banco de madeira, memórias.
Senta-se no banco um ninguém vazio, sonolento.
E, no fim do dia, o banco são memórias...

São memórias de duas crianças
que não se sentam em bancos velhos,
que se entretêm em casa
com modernos brinquedos...
São memórias do operário cansado
que não se senta a descansar
no intervalo que não tem
entre o aço e o jantar...
São memórias da velhinha enrugada,
paz à sua alma, eternamente,
que eternamente, ali sentada,
dará milho aos pombos, num gesto vago, muito lento...

Gerações de vazio que tem este pequeno banco de madeira.
Um vazio oco como a brisa que passa
e que acaricía o banco, lentamente,
penteando as acácias e as sebes
e esfriando os pobres padais...

É uma cidade.
E na cidade, há um jardim.
Nesse jardim há um banco vazio,
e no banco vazio estou eu sentado.
Em mim, há uma criança entretida,
um homem cansado e uma velha senhora esquecida.
Nestes três, há um só coração, que é o meu,
batendo lentamente e tão vago como este banco.
No coração de que vos falo, há frio.
Um frio que resulta de estar vazio,
porque o peito é insuficiente para travar a brisa.
A velha brisa das memórias...


10 Fevereiro, 2004

1 Comments:

Blogger Raquel Caldevilla said...

o meu preferido... sem dúvidas :)

4:37 da tarde  

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