quarta-feira, maio 19, 2004

Hoje Chove Dentro De Mim

Um estranho desconforto consome-me
como uma chama sedenta de arder.
Aqui, solitário, fechado dentro de mim,
Aqui, enclausurado entre o que serei e o que queria ser,
Vêem-me à cabeça postais desfocados
De outros lugares talvez encantados
Onde o sonho é tudo e é sinónimo de viver.

Mas aqui, dentro das quatro paredes
Da minha cansada e breve existência,
Todo o esforço de viver é trapézio sem redes,
Toda a ilusão é desmistificada em demência.
Chove. Continuamente. Mas chove dentro de mim.
Lá fora a noite é clara as pessoas passeiam pelo jardim,
Mas dentro de mim chove! Chove, e cada gota martela sem clemência.

Toda a quantidade de sentimentos, ambíguos ou objectivos
Correm dentro de mim confusos, como por um desatinado rio
Mas não têm foz onde desaguar e, no final, estão cativos.
Já revi toda a minha existência, reli-a integralmente, de fio a pavio.
Cansado, pousei o livro, por não conseguir aguentar.
Abri a janela na tentativa de, na aragem, me reencontrar
E lá fora, como vindo aconchegar-me do frio, a lua sorriu!